Era mais que um rascunho e mais que um esboço, era uma viagem: na verdade um jogo e aliás um desafio e sobretudo um modo de afastar o bloqueio e respirar ideias e atrair a inspiração, ela, a inspiração, distante naquela tarde quente jaraguaense em que caiu a dita chuva que saiu até nos jornais nacionais da globo & da band & da record, a mesma bendita record que jamais, eu disse jamais, publicaria aquele rascunho ou esboço, na verdade uma viagem que ela, ou de fato algum jocoso anônimo, permitiu: foi um jogo ou um desafio que ela mesma lançou ao público como quem lança pétalas ao vento, se bem que de fato ela as lançou a si mesma, desafiando-se, jogando-se no abismo dos improvisos como quem tece tramas durante o salto, tramas que podem salvá-la da fome gravitacional do precipício e interromper a vertigem luciférica da queda e apanhar cada pétala que trouxer uma gota de luz: a luz então reflete em seus olhos e seus olhos enxergam o além e outros olhos surgem na face pálida do papel, inclusive os de um rato, chapados, vermelhos, cansados de tanto rir, ainda mais cansados deste tédio tóxico destes dias tormentosos desta segunda década deste século vinte um: olhos de um desenho debochado, debochando de si mesma, dela, rata, chapada, artista oculta nalguma toca das paredes imaculadas dessa nossa santa sociedade, paredes que escondem ratos e insetos e pequenos répteis e anfíbios lisérgicos, todos como que anjos, caídos ou não, entocados nas paredes do inferno ou do céu: artistas, sim, artistas carcomendo as paredes que nos cercam, violando o silêncio que sufoca, esticando raios de luz na escuridão em que então despertamos com a boca amarga de ódio e olhos vermelhos de tristeza e só, de fato só, a esperança de um dia termos a liberdade daqueles olhos vermelhos do rascunho, do esboço, na verdade da viagem que ela fez, que ela cria, que ela é.
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