Talvez eu quisesse dizer de outros afetos, mas escolhi este.
Talvez, muito mais provável, que o afeto tenha me escolhido.
Essa coisa que invade a gente e não se sabe direito de onde vem e para onde vai. O que a gente sabe é onde o afeto fica em nós. Aquele aperto no peito, de repente, um arrepio, um sorriso, uma dor, um pensamento que não vai embora, olhos exageradamente úmidos…
De tantos afetos, diria o psicanalista, a angústia é o único que não engana. Aos demais, somos enganos, tropeços, lapsos. E a saudade, silenciosamente doída, talvez nos avise de um impossível de controlar, disso que fica e do que já se foi.
Saudade talvez seja teimosia de fazer presente um desejo de virar passado.
Neste tempo tão difícil e singular, tenho me encontrado nele.
Deste poema, eu não sei ao certo a sua idade, está por aí faz tempo e de vez em quando algum pedaço dele vem em minha memória.
Acho que ele me faz advertido dos enganos.
Acho que a saudade é um resto do que nos humaniza.
Resto
Saudade é palavra inquieta
Difícil atingir tradução
Corpo tomado em aflição
Quem se mete com ela, acaba virando poeta
Um sentimento tão nobre
Por vezes é pura necessidade
Não tem fronteira, nem idade
A rica miséria d’alma pobre
Não ficou nem o sujo do boi
O amor que partiu
O cão que não mais latiu
Acabou-se, foi
Tarde demais para dizer
Cedo é o tempo que me diz
Silêncio pelo que fiz
Não foi hora de perder
O tempo que não volta mais
A foto que não tem cheiro
O dia que se foi inteiro
A vida corrida demais
Resto da velha saudade
Quando secar todo rio
Virar um buraco vazio
Antiga cumplicidade.
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