Arte

Werner Schön: Cenas.

i. O anjo.

Ele desceu das nuvens e pousou em Jaraguá. Um tênue rubor cintilava em sua tez adolescente. A luz de seu sorriso acariciava o vale inteiro. Após o espancamento, entre sangue e escarro, seus olhos azuis suplicaram:

– Misericórdia!

Então o matamos. Não queríamos ver ninguém sofrendo.

ii. Adolar.

Me abordou na esquina da Domingos com a Reinoldo:

– Ei, moço, você não é o Adolar?

Adolar? Isso lá é nome? Quem é essa galega?

– Depende. O que você acha do Adolar?

Ela riu. Não tinha dentes bonitos. Mas peitos.

– Seu bobo! Como é seu nome então?

Eu disse um qualquer: Francisco. Ela era Ivete, tinha um shortinho sobre belas coxas.

– E aí, Ivete, tá a fim de inventar alguma?

Arrisquei tudo. Dei até as opções: o parque, o morro da antena, uma cachô em Corupá.

– Prefiro um lugar com ar condicionado.

Entendi. Pegamos a estrada pra Pomerode. E uma suíte com banheira.

– Ivete, me diz: quem é esse Adolar?

Seus olhos azuis pousaram no teto, malandros. Ela ainda ofegava. Não existia nenhum Adolar.

iii. Pérsio e o morro.

– Não vai, Pérsio, não vai!

Ele não deu bola. Ergueu a asa do chão. Fechou os olhos e sentiu o vento.

– Porra, Pérsio, tu acabou de fumar!

Ele abriu os olhos. Reparou nos urubus. Não ouviu o que eles disseram.

– Pérsio, tu tá louco cara! Tá frio, porra!

Um bafo quente mexeu a relva. Ele desceu a rampa convicto. E voou.

– Pérsio! Eu falei, caralho, eu falei! Responde, porra! Pérsio!

Ele não respondeu. Da garganta do morro nunca saiu um silêncio tão fundo.

Werner Schön

Werner Schön tenta fazer literatura. Em Jaraguá do Sul.

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