Opinião

Darwinn Harnack: A vida em face do inevitável

Darwinn Harnack: A vida em face do inevitável

Há uma frase pronta, dessas que são atualmente repetidas com frequência e que, para mim, não fazem sentido. É a seguinte: “a dor é inevitável, mas o sofrimento é opcional.”

Não é verdade. Trata-se apenas de um jogo de palavras. Os sofrimentos físico e psíquico decorrentes das vicissitudes da vida, não são facultativos. Pelo contrário, sofrer faz parte da vida de cada um de nós. De um jeito ou de outro, em um momento ou outro da vida, por uma razão ou outra, todos nós já sofremos e voltaremos a sofrer enquanto estivermos respirando.

Algumas pessoas são mais resilientes ao sofrimento do que outras, porém, dizer que o sofrimento é uma opção, como se houvesse simples escolha, soa para mim como mais um desses ilógicos mantras de autoajuda.

Não gosto de óculos cor-de-rosa. Prefiro a realidade crua da vida, que tem sua beleza e também seu horror aos olhos de uma individualidade temporalmente limitada.

A dor é inevitável e, sofrer, por consequência, é igualmente inevitável.

Da mesma forma, a morte é inevitável.

Conheço um monge que costuma dizer que “ao nascermos é como se alguém nos jogasse de um alto edifício com um laço de corda no pescoço. Para alguns a corda é mais curta e, para outros, é mais longa, porém todos terminamos do mesmo jeito quando a corda estica.”

Porém, o que fazer diante de uma vida com fatos inevitáveis?

Para responder a essa pergunta, gosto de uma fábula cuja idade e a autoria se perderam na noite dos tempos.
Conta-se que um homem caminhava lentamente através de um campo de trigo, com sua sacola no ombro. O sol aquecia sua pele e uma leve brisa lhe acariciava o rosto.

Em um determinado momento, o homem notou que olhos o espreitavam e acompanhavam, então logo percebeu que era um grande tigre.

Apavorado, deixou cair sua sacola e correu desesperado até a borda de um precipício. Não vendo alternativa, agarrou a raiz de uma árvore e pendurou-se no precipício, para escapar do tigre.

O tigre faminto o farejava acima. O homem, tremendo, olhou para baixo e viu, no fundo do precipício, outro tigre a esperá-lo. Apenas aquela raiz o segurava. Mas, ao observar com mais cuidado, notou que havia dois ratos, um negro e outro branco, roendo aos poucos a raiz em que ele se segurava. Neste momento seus olhos perceberam um morango grande e vermelho que vicejava ao lado.

Segurando a raiz com uma mão, ele pegou o morango com a outra e o comeu.

– Que delícia! Disse ele.

Fim.

*A obra que emoldura esse texto é de Henri Rousseau - Tigre em uma Tempestade Tropical (Surpreendido!) de 1891 – óleo sobre tela – Acervo da National Gallery, Londres.

Darwinn Harnack

Darwinn Harnack é advogado e professor.

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