A sociedade dos cupins é formada por três castas, a dos operários, dos soldados e a casta dos reis e rainhas.
Os cupins operários são a base da sociedade e responsáveis por cavar túneis no barro ou na madeira, coletar alimentos, cuidar dos cupins jovens, construir estruturas sólidas a partir dos materiais coletados, dentre outras atribuições.
Os cupins soldados são encarregados da defesa da sociedade, enquanto que rainhas e reis são responsáveis pela procriação e liberação de hormônios.
Existe harmonia na sociedade dos cupins. Todos trabalham como órgãos funcionais do grande organismo, que é o ninho.
A sociedade dos homens, embora mais complexa e multifacetada, guarda algumas semelhanças com a dos cupins, pois também pode ser atualmente dividida em três castas: operários, empresários e rentistas.
Os rentistas não trabalham, são a realeza pós-moderna e vivem de frutos financeiros de herança ou patrimônio constituído. Nada produzem, vivem às custas do trabalho dos outros.
Os empresários comandam os operários e recebem valores de bônus (mais-valia/lucro) pelo trabalho de cada operário que, somados ao final de cada período, proporcionam-lhes (quando bem-sucedidos) uma condição diferenciada na sociedade em termos de privilégios e possibilidades.
Já os operários são os responsáveis por todos os trabalhos necessários à manutenção da sociedade, seja na construção de moradias e empresas, no transporte e comércio de produtos, na prestação de serviços, segurança e outras atividades em geral, fazendo de fato, com que a sociedade funcione dentro do sistema organizado.
Apesar dessa semelhança, destaco uma diferença fundamental entre a sociedade dos cupins e a dos humanos.
Enquanto cupins trabalham sempre em prol da coletividade, ou seja, do ninho, visando o melhor sempre em favor do todo, o mesmo não acontece na sociedade dos homens.
Na sociedade contemporânea dos homens, a motivação para o trabalho vem por outro fator: a subsistência do indivíduo ou de seu pequeno núcleo familiar.
Logo, a preocupação primordial do homem contemporâneo não é o bem da coletividade. Ele não se sente parte de um grande organismo, não há sensação legítima de pertencimento e de acolhimento.
Pelo contrário. Na sociedade dos homens, ocorre a exclusão daqueles que não possuem poder de consumo, ou seja, a maioria dos membros são excluídos dos bônus do sistema por mal terem condições de assegurar sua subsistência.
Para além disso, na sociedade dos homens, o que predomina é a suposta “virtude” ideológica da competição. As condutas colaborativas e cooperativas são muito menos prestigiadas e incentivadas.
É a partir desse conjunto de circunstâncias que surgem, no seio da sociedade dos homens, sentimentos de estranho prazer com o insucesso, com as perdas e com as desgraças sofridas por outros iguais.
Faço essas considerações preliminares para uma breve reflexão sobre a Cúpula do Clima 2021, realizada no decorrer desta semana de abril.
As indagações que me ocorrem sãos as seguintes: por que essa pauta é tão difícil? Por que o avanço em compromissos necessários à sobrevivência no planeta é ridicularizado por uma parcela relevante da sociedade dos homens? Por que muita gente é indiferente a um tema tão relevante para o presente?
Novamente: porque a lógica competitiva de sucesso individual sobrepõe-se e abafa a preocupação com interesses difusos e maiores.
É a partir dessa falha perversa na formatação do mecanismo de vida coletiva dos homens, que a predominância de nossa espécie tende a gerar o colapso dos recursos naturais e da sobrevivência de si mesma e das demais espécies.
É indiscutível que temos algum nível de percepção do que deveria ser feito para o melhor da sociedade, ou seja, quais seriam as melhores opções para a humanidade e para o planeta, nosso ninho.
Mas temos dificuldade em concretizar porque existem obstáculos e resistências opostos por interesses econômicos e de competitividade que prevalecem, inclusive, sobre o nosso instinto natural de autopreservação e cuidado.
Ao que tudo indica, apesar dos muitos discursos formais em sucessivas Cúpulas do Clima, continuaremos caminhando conscientemente rumo a um colapso, justamente por não aceitarmos a insustentabilidade do modo de vida que criamos. Nosso ninho está ameaçado e não estamos conseguindo reagir aos defeitos do modelo econômico-produtivo que nós mesmos criamos.
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