Opinião

Depois de conquistada a liberdade

Depois de conquistada a liberdade

Depois de hoje, aniversário de nossa independência, teremos a liberdade. É o que dizem os bolsonaristas. Tentarei agora projetar o que seremos quando livres. São três cenários alternativos.

No primeiro, Jotabê e os seus soldados armados tomam o poder. Emparedam o Congresso. Sequestram o STF. Penduram o República no pau de arara. O Bolsonarismo se impõe ao resto do Brasil. Mas esse resto, a maioria, não dará adesão. A força bruta manterá o regime por alguns meses. O país, dividido e espoliado, entrará em profunda crise. Então, ao fim do pesadelo, a cabeça de Jotabê rolará para que outros mitos, liderando as mesmas armas sempre prontas a segui-los, consumem a promessa de uma pátria medieval. Ao fim desses sucessivos pesadelos, acordemos nos idos do século como um país de párias. Eis o primeiro cenário de nosso manhã livre: a liberdade à moda afegã.

Segundo cenário: Jotabê assume o poder e quebra o primeiro dos pactos que o conduziram ao Planalto: manda às favas Paulo Guedes e o capital externo. Com a Petrobrás, as mineradoras, as energéticas e outras empresas nacionais sob seu comando, controla o mercado dos bens básicos. Com isso, consegue ampla adesão da população: baixa o preço do combustível, da luz, da comida. Em 2024, com o trumpismo de volta ao poder, tem de novo o apoio externo de uma potência. A profunda crise econômica, somada à pervasiva restrição do direito de expressão, não impedirá que o regime se perpetue. Eis o segundo cenário de nosso futuro livre: a liberdade venezuelana.

Terceiro cenário: a república rende-se comovida ao poder do bolsonarismo. Legislativo, Judiciário, Forças Armadas, todos se convecem de que o mito tem o poder de se impor – e se ajoelham sem nem mesmo tentar resistir a essa imposição. Jotabê não precisará ser um ditador: será apenas o homem que trará as armas guardadas na algibeira. O regime terá um imenso poder de se capilarizar: cada juiz, cada policial, cada sacerdote será seu agente. O controle será macro e microscópio. De repente, depois de tantas mortes silenciosas, nós mesmos já não ouviremos nossa consciência: também nós, apoplécticos, diremos ao regime com o mais sincero ardor: “amém”. Toda a resistência será extinta. Eis o terceiro e mais extremo cenário de nosso futuro livre: a liberdade à moda brasileira.

Criaremos um novo modelo de liberdade. Uma tal, tão imensa e envolvente, que aniquilará nossa inútil consciência. Seremos felizes na mais completa submissão ao mito e na mais absoluta indiferença aos eventuais dissidentes – que não merecerão, aos nossos olhos enfim livres, senão morrer.

Vítor Véblen

Vítor Véblen é iniciado em literatura política. Viveu em Chicago, onde estudou economia. Mora atualmente em Joinville.

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