Ele, o homem virtual, o sujeito oculto por trás de fotos e mensagens nas redes sociais, o cometa que de repente surgiu no céu do meu iphone, ele voltou. Falei desse “personagem” em dois ou três textos desta minha coluna. Há leitores que torceram o nariz: minha astrologia não deveria se misturar com minha vida amorosa. Estavam duplamente errados esses leitores: nem a astrologia pode ser independente da vida da astróloga, nem esta vida tinha algum amor. Ainda assim eu cedi: esse personagem sumiu de meus textos. Agora ele volta: em novas mensagens ele acenou uma aproximação. Desculpem, mas eu preciso falar disso. Minha astrologia orbita em volta desse cometa cheio de fogo e frases ousadas.
“Eu te entendo”, ele escreveu. “Não fui capaz de te dizer quem sou. Tô aqui, agora, pra isso. Pergunte o que quiser.”
Gostei da ousadia. Ele deu passos largos na direção certa. Abria-se, revelava-se, despia-se.
“Diga o dia, a hora e o lugar em que nasceu”, eu escrevi.
Ele é canceriano. Tem um mapa interessantíssimo. O Sol no meio do céu em conjunção com Mercúrio. Ascendente em Libra com Marte, Saturno e Plutão. Urano e Netuno em Sagitário. Lilith em Capricórnio. Assim como eu, Vênus em Gêmeos. Em dois minutos cogitei mil comentários sobre seu mapa e sobre meu mapa e sobre as relações entre eles, que dizem tanto sobre a relação entre nós. Mas eu disse apenas:
“Você tem a Lua em Áries.”
Ele não entendeu o que isso significava. Mas entendeu o quanto. Excitou-se. Cobrou explicações. Implorou pela poesia que ele disse que sou capaz de fazer. E eu fiz. Meus versos disseram que a Lua rege Câncer. Que em Áries ela é intensa e ousada. Que assim ela o incita às ações mais corajosas, aos desejos mais potentes e às surpresas mais impactantes. Meu poema o intimava ao próximo e decisivo passo. Então ele disse:
“Por que devo crer nessas palavras? Não são arbitrárias essas interpretações?”
Essas perguntas foram uma surpresa impactante. Ele não abriu as velas ao vento da minha poesia. Guinou o barco e me desafiou com sua proa pontiaguda. De fato, ele tem razão: sempre há algo de arbitrário na astrologia. Por que supor coragem e ousadia na Lua em Áries? Por que a linguagem, como um prisma opaco, decompõe a luz dos astros em adjetivos tão vagos? Por que um certo arranjo astral sinaliza uma ação corajosa, um desejo potente, uma surpresa impactante: não é tudo isso, afinal, apenas o que eu espero dele? E ele, esse indivíduo único, fará o que eu espero?
“Não se trata de crer”, eu respondi, “mas de ouvir.”
“E por que eu deveria?”
Com essa pergunta ele se revelava cético. Mas também humilde. Ele expunha seu ceticismo a um teste. Ele me pedia pra mostrar o grande erro de sua racionalidade fria. Ele parecia me dizer: “vem, me leva com você nesse voo alto!”
“Não se trata de dever”, eu respondi, “mas de arriscar.”
Eu arrisquei tudo. Esta minha última mensagem era uma confissão e uma proposta. “Arriscar”, aqui, era pedir ao homem virtual que se tornasse real. E que entrasse plenamente em minha vida – tão plenamente quanto só um encontro pode permitir. Meu pedido era aquele de minha poesia: que ele ouvisse a Lua em Áries.
Não direi como terminou nossa conversa. Direi apenas que minha astrologia estava certa. E que ele a ouviu.
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