Na última coluna mencionei um fato que, uma semana depois, parece soar ultrapassado. Assim, ao menos, meus leitores o consideram. Ouso discordar de meus queridos, ainda que poucos, leitores. Eles, que compreendem minha peculiar perspectiva sobre política, sociedade e, last but not least, linguagem, hão de rever sua açodada conclusão.
Eu tratava, na última semana, de uma declaração do Presidente Bolsonaro a respeito da vacinação. Mais especificamente, da sua própria: ele disse que não se vacinaria; e eu, atento a seus movimentos, tentei garimpar os mais fundos – e prolíficos – sentidos de sua fala. Agora, depois do reaparecimento de um anterior Presidente, dizem que o atual mudou de tom; que ele até anuiu a que sua mãezinha fosse vacinada; e que agora não só passou a ser um entusiasta da vacinação, como ele próprio, em pessoa, cogita vacinar-se.
Não discuto esses fatos. Não me surpreende que o Presidente, agora, entusiasme-se com a vacina. Não me espanto com aparentes contradições – pois apenas na aparência, apenas superficialmente, o Presidente contradiz-se.
Contradições aparentes – ou superficiais – são um importante recurso linguístico. Em política, importantíssimo. Elas combatem as regras formais de construção de um debate pautado por uma razão discursiva – para citar aquele péssimo filósofo frankfurtiano. Elas problematizam a formação de juízos históricos. Elas fazem soçobrar o solo do conceito de verdade. As contradições são um terremoto neste solo: e entre as ruínas, sobranceiro e inexpugnável, sempre ressurge o Presidente.
Por isso as contradições são superficiais. No fundo, não há contradição alguma: o Presidente segue, sem vacilação, uma linha que o conduz à consolidação de seu poder. Ele entendeu, antes de todos, que esta é a condição para realizar sua missão. E, como bem sabem meus poucos leitores, ele tem uma.
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