O choro é nossa primeira linguagem. Nascemos chorando de fúria ou de medo. Chorando fazemos nossas primeiras interações. Fome, sede, dores, frios ou calores? Choro. Há já aí uma comunicação. O choro não é só o rompante de nossa natureza. É também a mensagem de nossas intenções.
Aos poucos a língua vai substituindo o choro nessa alta função. As palavras permitem mensagens mais claras. Demandas e queixas melhor elaboradas. Resultados melhores. Aprendemos isso por volta dos dois anos e aprimoramos a técnica sempre mais. Mas o choro não desaparece. Ele ainda é um recurso valioso. Traz a ênfase necessária às nossas mensagens mais importantes. É o sinal da nudez sincera de nossa linguagem infantil.
Por volta dos sete anos a língua substitui completamente o choro. A linguagem o expulsa de seus domínios. O choro é atirado em abismos escuros onde a luminosa razão supõe jamais ter ido. Enquanto houver rasgos da infância na personalidade que amadurece, o choro romperá aqui e ali. Então talvez ainda se ouça algo de sua mensagem, ou apenas se reprima sua vergonha irracional. Em todo caso, no fim a razão vence: então só nos resta chorar nos cantos escuros.
Apenas ali, ocultos, adultos choram. Ou nos palcos que a razão reserva ao espetáculo das lágrimas: traumas, consagrações e funerais. O choro então é só um vapor de nossas profundezas magmáticas. Sinal de convulsões pontuais em nossas vísceras. Grito de um impulso que aprendemos a calar – e que logo calará, assim pensamos sempre. O choro adulto não nos traz mensagem alguma. É apenas, no máximo, um estrondo além do território da linguagem: um relâmpago negro no horizonte.
Hoje, confesso, chorei.
Adulta, oculta, atenta. No meio dum silêncio que me permitiu ouvir o choro. No meio dum campo vasto em que brotou como mensagem. Ele então me disse algo. Com minha voz mais profunda. Com a força dum vento que arrasta meus anos todos. Com a tristeza calma e invencível dum herói de infância. Algo que eu trazia implícito. Algo que aqui, na clareira da linguagem que habitamos, não sei dizer.
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