Pela primeira vez na história da Libertadores dois técnicos de fora do continente ergueram a taça consecutivamente. Abel foi só o terceiro europeu a conquistar o título.
De todas as 60 edições de Libertadores raros foram os técnicos não sul-americanos que tiveram a sensação única de vencer o título mais importante que um clube pode ter no continente. O primeiro deles, o croata Mirko Jozić, levou o Colo-Colo ao topo da América do Sul em 1991. Mas após 57 torneios vencidos por sul-americanos, a maioria argentinos e brasileiros, como dois portugueses conseguiram o feito em dois anos consecutivos?
A resposta, é claro, passa pelo bom momento de Portugal no cenário do futebol internacional. Portugal é um país pequeno, com cerca de 10 milhões de habitantes, mas exporta muito mais jogadores e técnicos do que outros países de porte parecido. Muito se fala sobre a Escola Portuguesa de treinadores que ganhou o mundo na última década, alguns de seus representantes mais famosos que comandam times de diversas partes da Europa são: Fernando Santos (seleção portuguesa), Nuno Espirito Santo (Wolverhampton), José Mourinho (Tottenham), André Villas-Boas (Olympique de Marseille), Paulo Fonseca (Roma), Leonardo Jardim, além é claro de Jorge Jesus e de Abel Ferreira.
O sucesso português não é coincidência e passa por um processo de especialização dos técnicos que leva em conta o ensino tático, técnico, físico e até psicológico. Referência na Europa, o sistema da Associação Nacional de Treinadores de Futebol (ANTF) possui cursos em quatro níveis, voltados a capacitação dos profissionais.
Mas a formação de treinadores não é apenas uma opção no futebol lusitano, o Artigo 62.º do Regulamento de competições nacionais seniores da FPF exige formação profissional:
- “ Os Clubes participantes no Campeonato Nacional de Seniores devem obrigatoriamente inscrever um treinador principal e um treinador adjunto, os quais devem possuir as habilitações mínimas referidas nos números seguintes.
- Os treinadores principais devem ter obtido a habilitação de grau II (UEFA B) e os treinadores adjuntos a habilitação de grau I (UEFA C), devidamente comprovada através de cédula de treinador de desporto, verificando-se a correspondência dos graus nos termos da lei.
Vale lembrar que a regra nem sempre é respeitada, em março de 2020, a ANTF repudiou a contratação de Rúben Amorim por parte do Sporting (que hoje faz um ótimo trabalho a frente do clube), que não tem a licença exigida no regulamento.
Não foi sorte…
Muitos são os pontos positivos que se pode destacar desse sistema e dos próprios treinadores formados por ele, mas talvez o principal deles seja a capacidade de adaptação. Tanto Jesus quanto Abel, apesar de muito diferentes, foram capazes de ajeitar com a mesma rapidez dois times rondados por incertezas, transformando os mesmos em vitoriosos. Jesus ainda faturou o Brasileirão, Abel tem a oportunidade de vencer a Copa do Brasil onde enfrenta o Grêmio na final.
O Palmeiras foi merecedor do triunfo na Libertadores: passou em primeiro no seu grupo com certa tranquilidade, ainda sob comando de Luxemburgo, teve adversários mais fáceis que os demais nas primeiras fases de mata-mata, mas quando deu de cara com o sólido River de Galhardo, o time que todos queriam ser, soube jogar tudo na ida, e conseguiu segurar na volta (mesmo que não tenha sucumbido por pouco em uma péssima atuação coletiva). Não foi incontestavelmente dominante, poderia ter sido eliminado pelo River, ou ter perdido a final equilibrada para o Santos, mas o futebol não é sobre especulação e a américa foi pintada de verde novamente.
Em 2019 a trajetória do Flamengo também foi influenciada com a chegada de outro português, de certa forma com um futebol mais dominante, que também correu riscos, mas que no final foi superior ao seu adversário taticamente.
…Mas também não é a regra
É importante ressaltar aqui que o fenômeno gerou (especialmente no Brasil) uma demanda exagerada por técnicos estrangeiros, especialmente portugueses, apenas por conta de sua nacionalidade. Os casos de fracasso foram muitos: Santos com Jesualdo, Avaí com Augusto Inácio (após apenas 7 jogos), Vasco com Sá Pinto, Flamengo com Domènec (apesar de não ser português, foi uma aposta um tanto sem sentido para quem queria preservar o estilo praticado por Jesus). Essa onda pode ser reforçada ainda mais pelo título palmeirense, mesmo assim sempre prevalece a necessidade de enxergar se o estilo do técnico é compatível com o projeto do clube, quando esse o tem.
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