Arte

Oscar 2022 – melhor filme internacional

Oscar 2022 – melhor filme internacional
Detalhe de "A pior pessoa do mundo"

OSCAR 2022 – MELHOR FILME INTERNACIONAL

A categoria Melhor Filme Internacional, para a The Academy Awards, é aquela onde os diálogos, em sua maioria, não são falados no idioma inglês. Ou seja, uma categoria para amplificar a soberba estadunidense e sua língua oficial. E, aqui, pode-se discutir eternamente o simbolismo e significado de tal egocentrismo, mas, confesso, não estar afim neste instante. E nem acho que seja o momento. Até porque, neste prêmio, eu assisto às melhores obras indicadas, o que retifica o pensamento de que só Hollywood sabe fazer cinema.

Com a pipoca preparada, vi as cinco indicações e expresso minhas considerações nestas mal traçadas linhas. São opiniões particulares que refletem meu sentimento no momento, que podem (e devem) ser questionadas e não tidas como verdade absoluta. Inclusive, as notas dadas no final são para me guiar dentro da minha análise cinematográfica. Não me levem a sério (ou não) e assistam a todos os filmes. São eles, em ordem alfabética do título em português brasileiro:

A FELICIDADE DAS PEQUENAS COISAS 🇧🇹
No lugar do PIB, o Butão criou o FIB, Felicidade Interna Bruta, cujo índice é avaliado pelo rei em busca de melhorias do bem estar da população. Isto é bastante claro e segue como premissa deste belo exemplar de filme butanês. Essencialmente simplória, a obra viaja as montanhas do país subindo, literalmente, em direção aos céus, onde, metaforicamente, o homem é mais humilde, cortês e feliz. No estilo “a cidade grande torna o ser humano frio e desconectado com a natureza”, o longa funciona muito bem como propaganda imagética de um lindo local a ser visitado. Pois fabular sobre a corrupção pela sociedade do homem puro, apesar de bonito e singelo, não funciona em pleno século XXI. Mas, por se tratar de costumes distantes e valorização do professor, há esperança de cativar os espectadores como lição de vida oferecendo uma reflexão pronta. E quem a receber assim com certeza irá se emocionar. Nota 6,5.

A MÃO DE DEUS 🇮🇹
Possuindo todos os sentidos e temperos da excelência do cinema italiano, esta autobiografia real e surreal é deliciosa. Aludindo ao gol de Maradona e ao entorno que tal tento simbolizou, especificamente para os napolitanos, eis uma obra política, reveladora e dotada de esperança e dor tal qual a juventude que guerreia. É cativante e perspicaz mas apresenta certas desconexões por causa do excessivo número de personagens secundários, pois muitos são deixados pra trás e outros aparecem e somem sem explicações. Mas quem há de dizer que a vida não é desconexa? Assim, nessa picotada relação de beleza e tristeza eximiamente fotografada pelas câmeras de Paolo Sorrentino, há encantos e descobertas. Logo, saboroso. Nota 7,5.

A PIOR PESSOA DO MUNDO 🇳🇴
O título já vem carregado de baixa autoestima. Além de ser um soco no estômago da geração do novo milênio, tão acostumada com a facilidade tecnológica que se desespera e se sabota diante das adversidades normais da vida real. Até porque as fronteiras do amadurecimento precisam ser ultrapassadas, por mais delicadas e perigosas possam ser. Amor e família são o pano de fundo mas o foco fixa no individual – afinal, o que Julie quer? E os diálogos (ou a falta deles) são essenciais para desnudar tal radiografia proposta pelo diretor norueguês, que joga, propositalmente, a dúvida pra brigar com a incapacidade numa personagem altamente convicta e capaz. Uma dualidade encantadora, contestadora e reflexiva. Nota 8,5.

DRIVE MY CAR 🇯🇵
Mistura de literatura, teatro e cinema numa realidade multilíngue onde o luto e o autoconhecimento são os donos do espetáculo. Além da reconstrução pessoal (não à toa Hiroshima é escolhida como cidade da narrativa), sobre relações e afetos. E são situações complexas e complicadas retratadas, como solidão, culpa, fuga e autoflagelo, no melhor estilo do cinema japonês, com calma e precisão de detalhes (vide a leitura meticulosa do roteiro repetidas vezes), o que justifica suas três horas de duração, pois o tempo também é personagem já que se pensa o passado como estrada pra construir o futuro. Outro personagem marcante é o carro Saab 900, local onde verdades surgem como simples piscar de olhos. E, de uma maneira singela e perfurante, o realismo de Anton Tchekhov encerra esta bela obra: “você nunca conheceu a felicidade, mas espere”. Não recomendado àqueles que veem filmes com pressa, pois o cochilo virá invariavelmente. Nota 8,0.

FLEE: A FUGA 🇩🇰
Um excelente documentário em animação sobre a vida de um homem homossexual fugido do Afeganistão que encontrou abrigo e amor na Dinamarca. Um capítulo extraordinário de uma vida comum e bastante costumeira de países que sofrem com guerras, num mix de ficção e realidade documental bem interessante e sensível. Longe de ser inédita ou autoral, esta obra explicita o tratamento dado aos refugiados na Europa sob um olhar mais evasivo e sem rancor. Talvez, por isso, a narrativa se mostra um pouco monótona, porém, eficaz na liberação de memórias apagadas pelo trauma de fugir pra sobreviver. Interessantíssimo! Nota 8,0.

Portanto, A PIOR PESSOA DO MUNDO, de Joachim Trier, é o meu preferido, mas ficarei satisfeito com qualquer vencedor (e será uma surpresa se DRIVE MY CAR não ganhar), pois são excelentes obras repletas de alegorias e pensamentos que refletem muito dos seus países de origem. Porque, nesta categoria, a representatividade é tão importante quanto o produto final. Que a Academia esteja iluminada em sua escolha!

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