Há um tipo de apreciador de música que é, por assim dizer, exigente. Em regra, ele desenvolve seu gosto musical na pós-adolescência, época em que vislumbra, como alguém que chega pela primeira vez ao topo da montanha, a enorme extensão do mundo. Essa visão muda sua vida: tudo que é belo, tudo que é valioso, tudo que seja digno de apreciar – tudo isso tem que ser vasto e complexo como a geografia que ele, atônito, vê lá do alto.
Os fãs do Rush são assim. O trio canadense formado por Geddy Lee, Alex Lifeson e Neil Peart alcançou a vastidão e a complexidade que o apreciador exigente procura. A música da banda tem uma geografia riquíssima, cheia de vales e montanhas, picos e abismos, desertos e recantos. Um fã do Rush, jamais refeito do baque de ouvir os sete minutos de YYZ, toma a banda por padrão máximo e definitivo da música: Lifeson é o melhor guitarrista do mundo; Lee, o melhor baixista; Peart, um deus com baquetas nas mãos. E ponto final.
Os três músicos, para esse tipo de apreciador da música, são os reis. Entre tais apreciadores está Les Claypool, líder do Primus. A banda, também um trio e também canadense, saíra numa turnê em homenagem ao Rush. Farão mais de 40 quarenta apresentações em que executarão todas as faixas do álbum “A Farewell to Kings”. A turnê tem um título bastante previsível, ainda que rigoroso: “um Tributo aos Reis”.
É uma grande notícia. Especialmente para os fãs do Rush. O Primus é uma grande banda, de músicos virtuosíssimos. Les Claypool é aclamado, há décadas, como um dos grandes baixistas do rock. Sua reverência ao Rush é indiscutível. Nenhuma outra banda no mundo seria capaz de executar essa missão tão bem.
Os fãs do Rush torcerão os narizes para um ou outro detalhe. Notarão faltar algum acorde de guitarra. Reclamarão da vocal de Claypool. Dirão que não, não adianta, ninguém consegue imitar Neil Peart. Mas, afinal, esses fãs perdoarão: melhor que ninguém, eles sabem que a missão é dificílima. Ou melhor: é impossível. Reis são reis. E ponto final.
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