Opinião

Vini

Vini

Domingo, quatro da tarde, eu via o Fla-Flu. Mas um outro jogo me atiçava a atenção. Um outro clássico. Não resisti a dar uma espiada: o Real vence o Atléti por um a zero, o time branco arma um contra-ataque, a bola chega em Vinícius Jr…

De propósito escrevi “o time branco”. Entre os tantos adjetivos desse clube monárquico e franquista, um ressaltava: branco. Talvez porque ali, naquele jogo, esse adjetivo se espalhou por tudo. Também o Atléti foi branco. A imprensa local: branca. Todas as grandes instituições do futebol espanhol: opressivamente brancas. Vini era um rasgo nessa perversa branquitude.

Deixem-me contextualizar. Há duas semanas, contra o Mallorca, Vini foi cassado em campo. Ele não afinou: reagiu, chamou o jogo, decidiu. Mas grande parte da imprensa espanhola o criticou. Disse que ele exagerou, que fingiu, que se “neymarizou”.  

Dias depois, num famoso programa da tevê, um comentarista criticou as comemorações do Vini. Sim, as comemorações: quando ele mete um gol, faz dancinhas. O espanhol sugeriu que isso é um deboche, uma ofensa e – atenção à palavra – uma macaquice.

Vini respondeu. Essa resposta – num vídeo curto e implacável – foi das melhores que já vi. Raras vezes um jogador foi tão correto na escolha das palavras. A inveja, a xenofobia, o racismo – as verdadeiras razões das críticas – foram apontadas com uma clareza irretocável. Preto no branco.

A branquitude hispânica reagiu. O Atléti, traindo sua história, foi mais branco que nunca. O Real, em uma “nota de repúdio”, foi chapa branca. Mesmo Ancelotti, o técnico, deixou passar em branco a ocasião – na verdade, amarelou. As palavras do Vini lutaram sozinhas. Ou melhor: sozinhas elas conseguiram convocar as vozes de quem não se omitiu. E o coro assim soou alto, forte, perturbador.

A bola chega em Vinícius Jr. Ele dribla o marcador, passa a Modric e recebe na frente. Entra na área e chuta: ela bate na trave e sobra limpa pra Valverde, outro “sudaca”, fazer o gol. Foi o gol da vitória. A vitória do Vini. A derrota do racismo.

Mas bem claro: uma derrota ocasional no contexto duma disputa maior, muito maior. Que está longe, muito longe de acabar.

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