Opinião

As copas dos cataris

As copas dos cataris

Há poucos europeus no Catar. Poucos se comparados, por exemplo, aos latino-americanos. Creio haver duas razões pra ausência deles. Uma é nobre: o boicote em repúdio ao Catar e à FIFA. A outra não: o racismo.

O racismo dos europeus dirige-se a todos os não europeus – incluindo nós, da América Latina, descendentes mestiços e bastardos. Mas creio que é ainda mais virulento contra outros alvos. Contra os cataris, por exemplo.

Eis quem são os cataris, de alto a baixo da rigidíssima pirâmide social: a família do emir; as famílias amigas do emir; as famílias nativas (árabes) sem a nobreza que confere a amizade do emir; e os outros.

Os outros naturalmente são a esmagadora maioria da população. São praticamente toda a força de trabalho do país. E são quase sempre africanos ou asiáticos. Muitos vêm da grande Índia, que inclui Paquistão e Bangladesh. Têm biotipos característicos. E são, em regra, pobres.

Estes, os “outros” cataris, estão longe da copa. Muito longe. Muito embora ela aconteça diante de seus olhos baixos. Eles não estão nos estádios. Nem diante dos telões da FIFA reservados a turistas estritamente identificados. Nem mesmo em suas casas eles veem a copa: o sinal aberto da tevê não lha concede. Entre as tantas copas dos cataris, a deles se restringe às calçadas das periferias onde os jogos passam em tevês nas vitrines.

O racismo dos europeus, eu creio, dirige-se sobretudo a essa sociedade medieval de senhores árabes e vassalos subsaarianos ou hindus. Em suma: dirige-se a esse mundo “bárbaro”. Mais que racismo, é repugnância: deve embrulhar seus estômagos saber que o mais importante legado europeu – a civilização “moderna” – acomoda tão bem essa barbaridade.

Vítor Véblen

Vítor Véblen é iniciado em literatura política. Viveu em Chicago, onde estudou economia. Mora atualmente em Joinville.

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