Nestes dias descobri a existência da “fla-mimimi”. Não é exatamente uma torcida organizada do Flamengo. É um grupo de torcedores com opiniões em comum e atuação volumosa nas redes sociais. Juquinha, meu amigo flamenguista, confessou ser um deles e revelou os detalhes. Como o nome sugere, são torcedores lamuriosos. Eu, como bom botafoguense, entendo bem de lamúrias e me permito dois dedos de prosa sobre o tema.
O “mimimi”, ou as lamúrias, têm um destinatário inequívoco: Ceni, o Rogério paulista. O pobre ex-goleiro-goleador sofre sob o fluxo de um choro torrencial. Todos os males que afligem os flamenguistas, dos buracos no Maracanã aos buracos na camada de ozônio, são atribuídos a ele. Ceni carrega nas costas a sonolência do Vitinho, a esterilidade do Michael e o biquinho emburrado do Pedro. Ceni é “burro” por ter escalado o Arão na zaga, e depois no meio-campo, e agora simplesmente por tê-lo escalado. Ceni é “boca mole”, é “bunda mole”, não tem liderança e se tornou refém dum elenco mimado. Ceni não tem esquema tático, não tem jogada ensaiada, não corrige as falhas da zaga nas bolas aéreas. Ceni substitui mal, o que é claro indício de que ele não sabe “ler” o jogo. E sobretudo: Ceni é paulista, são-paulino, com uma arrogante indiferença aos valores sagrados da carioquicidade e do flamenguismo.
Os grandes arautos da “fla-mimimi”, segundo Juquinha, são Venê e Cahê. De vez em quando ele me encaminha as mensagens de algum desses dois no whatsapp. Basicamente elas se fixam em algumas das lamúrias enumeradas no parágrafo anterior. Eventualmente elas contam uma fofoca: alguma rusga entre o Ceni e a diretoria, ou entre o Ceni e o elenco, ou – o que é mais comum – entre o Ceni e alguém do elenco em cuja cabeça a diretoria passa a mão paternalmente. Tudo em típicos textos de whatsapp: com má pontuação e péssimos propósitos.
Sim, há um propósito por trás de todo esse mimimi. Uma explicação pra todo o descontentamento com o Ceni – que é justo em alguma medida, mas claramente excessivo. E isso é o que tem de mais engraçado nessa história toda. O propósito, a explicação, a motivação por trás do Cahê e do Venê, do mimimi e do tititi, é ele: Renato Gaúcho. O abalo sísmico que ameaça derrubar o cenismo tem epicentro em alguns metros quadrados de Copacabana. Ou de Ipanema. Sei lá onde o Renato joga futevôlei.
O cerne da instituição flamenga, o centro nervoso da nação de dezenas de milhões de apaixonados, a mais alta fonte propagadora das verdades de ocasião que afetam a existência do universo flamenguista – enfim, essa instância básica e nuclear do pensamento rubro-negro se encerra, atualmente, numa cena não exatamente digna de tão vastas repercussões: Cahê e Venê em volta do Renato, de sunga e óculos escuros e correntinha de ouro, numa praia da zona sul.
O mais engraçado é que o tititi está forte como nunca. Cahê escreveu que Ceni está isolado no Clube. Venê falou que suas “fontes” confirmaram o boato. O público rubro-negro vocifera estimulado pelos impulsos nervosos – aliás, nervosíssimos – que vêm de Copacabana. Ou de Ipanema, sei lá. Ceni cairá se perder pro Atlético hoje. Aliás, talvez caia mesmo que vença. Na verdade, não importa a vitória do Flamengo. A grande vencedora, nessa peculiar e hodierna arquitetura comunicacional da nação rubro-negra, é a fla-mimimi.
O Renato vem aí. O mimimi vai estancar por um tempo. Haverá vitórias, talvez títulos. O treinador, já naturalmente espaçoso, vai ficar ainda maior. Então faltará espaço no palco rubro-negro. Não haverá bastante céu pra tanta estrela. O time rachará. As derrotas virão. Venê e Cahê se voltarão contra o antigo “parça”. O mimimi ressurgirá com força. E o Flamengo, que está poderoso como nunca, terá gasto muito poder num ciclo que se encerrará em vão. Não precisam crer: são só vaticínios dum velho botafoguense. Mas, como eu já disse, de mimimi a gente entende. De ciclos que se encerram em vão, mais ainda.
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