Opinião

Danilo Otoni: O dia em que minha terra parou

Danilo Otoni: O dia em que minha terra parou

21 de agosto de 1989. Era uma segunda-feira e eu não havia decretado feriado. Pelo contrário, descansava em frente à televisão para encarar uma tarde de aula na escola. À época, eu já era uma criança transbordando desejo de consumir cultura. Tinha apenas sete anos mas aguçava curiosidades musicais. Até porque, em minha casa, meus pais colecionavam elepês e havia uma potente aparelhagem de som. Meu espelho de filho era querer mexer na vitrola assim como meu pai.

Eu não tinha um ídolo, ainda. Mas reparava em tudo, ainda mais com aquelas capas e contracapas que me fascinavam (e fascinam) como um urso em busca do mel. Então, a programação da TV parou e tocou aquela fatídica música do plantão da Rede Globo. Olhos atentos e ouvidos abertos no que se passava. Naquele momento, meu mundo parou. E, consequentemente, mudou. Era anunciada a morte do cantor e compositor Raul Seixas.

Confesso que eu não tinha nenhuma relação musical com Raul. Porém, lembrava de dezenas de discos dele que havia em minha casa. Assim, acendeu um ponto de exclamação na minha mente. Esperei a hora do almoço para, por minha boca, meus pais saberem do ocorrido (já que ambos trabalhavam fora). Vi o susto e a desilusão em seus rostos e pensei comigo: esse cara tem poder.

Voltei pra casa correndo depois da aula, pois havia decidido devorar a obra de Raulzito. Queria sentir toda aquela coisa, se era mesmo bela e linda como uma criança dormindo. Costumo dizer que, sim, era forte. Tão forte que até hoje não consegui parar de escutar. E, em todo ano, nesta data, comemoro meu réveillon particular, como se a supracitada memória fosse o despertar de tudo que, culturalmente, agora sou.

A Raul, aquele que tem medo do escuro e que não tem colírio, minha reverência em toda sua irresponsabilidade e irreverência! Meu super-herói do disco voador bem aventurado na cidade de Thor, ao som da flauta da mãe serpente! Coisas que ele fazia há dez mil anos atrás. Porque, somente há 32 anos, foi fazer um som com Deus. Ou com o diabo, sei lá.

Comentários:

  1. Emocionante!❤️
    E não tem como não ser fã do Raul, um gênio!

    Diana Meiras em 21/08/2021
  2. Eu consegui reviver aquele dia também. Embora eu já tivesse um LP do Raul que minha mãe havia me dado para me apresentar o rock nacional, obviamente era novo demais para entender o alcance que ele tinha e ainda tem. Marcante! Mas acho que ele foi ter com aquele cara mais underground mesmo… rs

    Gabriel Amorim em 21/08/2021
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