A “notícia” veio pelo whatsapp: Paolla Oliveira teria dito que, se Bolsonaro ganhar a próxima eleição, as atrizes da Globo terão que se prostituir pra sobreviver. Na hora eu pensei: é fake. Levei três minutos pra verificar: era fake, de fato. Bisonhamente fake. Mas três minutos é muito tempo num grupo de whatsapp.
As piadinhas surgiram em três segundos. Vinham de um parente: homem casado, entre quarenta e cinquenta anos. Eu esclareci que se tratava de fake news. Postei três reportagens no grupo. Numa delas, Paolla Oliveira falava do quanto sofria com isso. Mas as piadinhas não cessaram. Meu parente, citado acima, dizia coisas do tipo: “agora tô com Bolsonaro”. Pensei comigo: ele que vote em quem quiser. A questão não é essa.
Todos no grupo admitimos que a notícia sobre a Paolla era fake. Todos sabíamos o quanto essa difamação deve doer. Mas mesmo assim as piadinhas não pararam. O tal parente talvez tenha notado que eu me incomodava. Isso o tornou ainda mais cruel. Sempre há quem ache engraçadas essas piadinhas (e essa crueldade). E ele parecia ter um arsenal daquelas (e uma fonte inesgotável desta). Estava claro: a fábrica da notícia falsa também produzia as piadinhas. A falsidade não era só criminosa. Era lucrativa: há quem ganhe – não apenas dinheiro – com isso. Sim, sem dúvida: há quem se aproveite da fake news. Cada piadinha compartilhada, cada “kkk” a aplaudi-la, aproveita a quem controle essa maquinaria porca que cria e espalha falsidades. Mas a questão também não é essa.
A questão talvez seja: o que diabos esse homem – esses homens todos que propagam a notícia falsa e as piadinhas – têm na cabeça? Eles sabem que a notícia é falsa. Sabem que a falsidade machuca. Mas cometem o crime dolosa e continuadamente. Esse dolo, esse impulso por trás do crime, é perverso. Eles querem que a Paolla fracasse. Que seja demitida. Que tenha que se prostituir pra sobreviver. É um machismo destrutivo, sádico, escroto. Seja lá o que esses tais homens têm na cabeça, é repugnante. Sim: é um machismo repugnante. Mas ainda não é essa a questão.
O ponto é que esse machismo é fake, esses homens são machos fakes: esta é a questão. Um macho real é atraído pela mulher plena, poderosa, realizada. O alvo da excitação do verdadeiro macho é o auge da fêmea, a mais alta manifestação do ser feminino. Os machos fakes se excitam com a fraqueza da mulher. Querem elas dependentes, suplicantes, jogando-se a seus pés por um punhado de moedas. A prostituta os excita: ela não os julgará, ela se contentará com o dinheiro. Esse falso tipo de macho se excita sobretudo com as conquistas de seu dinheiro.
Imagino aquele meu parente – homem casado, entre quarenta e cinquenta anos – diante de Paolla Oliveira. Imagino, só pra argumentar, esta hipótese imponderabilíssima: ela o convida pra sair. Eles vão a um restaurante. Ela fala de sua vida, de suas realizações espetaculares, de seus amores principescos e abrasantes. Ele fala de sua pequena empresa, de seu carro importado e do quanto ganhou apostando na alta do dólar. Ela não quer saber disso: pergunta sobre as mulheres que ele conquistou, os êxtases que experimentou, os poemas que escreveu. Ele se inibe, não sabe o que dizer, pede a conta. Ela já havia pago. Ele arrisca convidá-la, apenas pra não admitir seu pânico e com a convicção de que ela não aceitará, a ir a um motel. Ela aceita: quer experimentar os efeitos de sua hipnótica beleza emoldurada por um vestido longo que revela sua silhueta impecável. Ele veste uma camisa azul manchada com o suor de sua barriga flácida: há também suor nas têmporas, no pescoço, nas mãos. Eles entram no quarto. Ela tira o vestido e é a mulher mais linda que já se viu. Trêmulo, ele tira as calças e revela que sua propalada virilidade tem – no instante em que se exibe diante de alguém tão superior – o aspecto de uma uva passa (o aspecto, mas provavelmente não o gosto, que deve ser amaríssimo). Ela pensa em gargalhar, mas apenas ergue as sobrancelhas altivamente enquanto se veste. Deixa escapar um sorriso sutil no canto da boca. E desaparece.
Paolla Oliveira, tanto na hipótese imaginada quanto na realidade destes dias tristes, é a mesma: uma mulher deslumbrante, uma artista consumada, uma pessoa segura e consciente de sua posição no mundo – e feliz com isso. Já o macho fake é no fundo um homem triste: o dinheiro que tem, o lixo que consome, as sujas verdades em que tenta acreditar – nada disso impede que de repente ele se descubra vazio, desprezível, impotente. Meus sentimentos cristãos deveriam me fazer ter pena dele. Mas só tenho nojo.
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