Ele é jovem, bem sucedido e faz um sucesso estrondoso no tal “instagram”. Veste boas roupas e bebe bons rosès. Retoca periodicamente os grisalhos, que só ressaltam sua juventude, e sempre usa pomada fixadora no impecável topete. Mais que tudo, ele ama o Barça e venera o Messi. Eis, em apertado resumo, o meu caro amigo Juca: a perfeita antítese de mim. Sim, a perfeita antítese. Eu sou velho e manifestamente ignorado pelas redes, sociais ou não. Bebo só cerveja, além de umas purinhas esporádicas, e visto só calções e chinelos; quando muito, a camiseta do Marcílio que ganhei do Rosemiro em 89. E sou inapelavelmente careca. De resto, sofro de botafoguismo e juro que prefiro, ao Messi, o Heleno de Freitas.
Ainda assim, eu e o Juquinha mantemos uma jucunda amizade. Ou mantínhamos. Até a semana passada. Até meu último artigo nesta coluna, em que eu tratava dos melhores jogadores de todos os tempos e “me atrevi” – o verbo é dele, Juca – a deixar o Messi de fora. O meu amigo enfureceu-se. Brilhou em seu semblante a luz mais iracunda. Nosso canal de comunicação – o tal “whatsapp” – tornou-se um rio caudaloso de impropérios despejando-se em meu aparelho, que aliás manuseio com dificuldade. Eu pude mesmo imaginar o impecável topete rachar a casca dura da pomada fixadora e, paroxístico, tremelicar de raiva.
Tentei aplacar a ira do meu amigo. Disse-lhe que reconheço o talento do craque barcelonista. E até, numa concessão que me pareceu sinceramente relevante, incluí Messi na minha lista dos 25 maiores jogadores da história. Qual o quê! Foi dizer isso e o Juca explodir num arroubo de fúria. Mal pude compreender as invectivas que me desferiu. Só sei que me mandou às mais abissais profundezas do inferno junto com Pelé, Zizinho, Leônidas e Heleno.
Então fui eu que me enfureci. Tudo bem suportar as rusgas que só se permitem nas mais arraigadas amizades. Tudo bem ouvir os delírios de que Messi é o melhor de todos os tempos e esta época, a atual, a mais prolífica. Tudo bem mandar ao diabo Pelé, Zizinho, Leônidas e mesmo eu. Mas falar do Heleno, aí não! Aí ele excedeu todos os limites. Agora era eu que explodia e o exortava a catar coquinhos! Nossa amizade desde então foi interrompida. Nem mesmo o famigerado “whatsapp” já nos une. Abriu-se entre nós um abismo de mudez.
Mas confesso: depois de alguns dias, sinto saudade. Saudade de nossas parlas. Saudade de suas elocubrações sobre o “carrossel do citão” e sobre a “saída de bola lavolpiana” – seja lá o que forem isto e aquilo. Saudade de sua peculiar poesia: “quero um time que se mova como uma borboleta e pique como uma abelha”. Então, por saudade, cedi. Escrevi mensagens. Fiz confissões de apreço ao futebol deste século. Cheguei por brincadeira a falar mal do Heleno, reputando-o esnobe com aquele cabelo sempre cheio de pomada. Receio que a piada não foi feliz. Em todo caso, minha bandeira branca tremulou em vão.
Então só me resta dedicar a ele, ao meu caro amigo Juca, este artigo. Tenho esperança de que o lerá e, afinal, me dará seu perdão. Tenho inclusive uma esperança que talvez lhe parecerá insólita: a de que este artigo lhe inocule a ideia de se tornar um de nós – nós, os que fazemos a Abertura.
Por que não? Por que o Juquinha não pode ser um dos nossos colunistas? Ele há de escrever os delírios de sempre, é verdade; mas hão, esses delírios, de ser apreciados – decerto mais que os meus. Se ele gostar da ideia, eu me comprometo a falar com o Teco. Seria incrível, eu argumentarei, ter aqui um debate futebolístico de dois contendores tão próximos e separados todavia por discrepâncias oceânicas. Seria ótimo, com isso, reatarmos nossa amizade. E seria sensacional desfrutarmos dessa amizade também na Abertura.
Ao Juquinha, como ele próprio costuma dizer, “fica a dica”. Acho que, além do perdão, ele dará consentimento à ideia. Pero… no lo sé. A conferir.
Comentários: