Eu assisti a apresentação da turma do sexto ano da minha filha. Foi sobre os trabalhos de Língua Portuguesa que estão realizando até aqui.
E um destes trabalhos foi a leitura dirigida e acompanhada de alguns capítulos do Diário de Anne Frank e depois, cada uma escreveu uma carta para ela.
A apresentação foi virtual e as que quiseram ler, leram suas cartas. Minha filha leu.
Nos últimos dias houve uma tentativa de censurar este livro por parte de alguns pais por aí, com o argumento que o livro trazia questão sexuais. Basta dar uma pesquisada por aí que esta polêmica segue como no tempo da Idade Média, quando se acreditava em “crianças anjos”, desprovidas de satisfações, desejos e principalmente de uma grande curiosidade sobre os corpos, seus corpos, como se faz um bebê, como nascem os bebês… Cada um com seus botões e a humanidade, tempo vai, tempo vem, tropeça no mesmo degrau.
Foram cartas simpáticas, cheias de gentilezas e empatia para a menina judia, que se escondeu para sobreviver e morreu na câmera de gás do campo de concentração e trabalhos forçados de Auschwitz.
Eu assisti toda apresentação com um nó na garganta. Todos ali na escola, todos usando máscaras, todos com aquela tensão do abrir as cortinas, do inaugurar um lugar.
Foi simples, foi lindo, foi triste, foi muito importante.
Mas porque escrevo sobre isso?
Não sei ao certo, mas tenho a impressão de uma necessidade de transmitir o humano, que o mesmo homem pode ser bárbaro, brutal, destruidor e também pode ser gentil, empático, solidário.
E minha pergunta que insiste é se é possível uma escolha neste nível.
Primo Levi, em seu livro ‘é isto um homem?’ diz em certo momento que só os piores sobrevivem a Auschwitz. Pois é preciso roubar a comida, a roupa, carregar o menor peso no trabalho, pois se não fizer, morrerá primeiro.
Talvez haja uma pequena possibilidade de escolha, sim. Talvez a gente possa escolher a vida.
Uma vez escutei um Psicanalista dizer que a morte sempre vence. Cedo ou tarde, ela triunfará. Mas só e somente só o amor é capaz de frear o trem desgovernado que ela representa. Diminuir a velocidade da morte é a força do amor.
Então, é por isso que escrevo sobre as cartas para Anne Frank que a turma da minha filha escreveu.
Resgatar o peso e a profundidade da palavra Amor, resgatar o que importa na vida, a minha, a sua, a do diferente, do estrangeiro, do bicho, da árvore… Enquanto esticamos a corda, com a força que nos cabe, com a vontade que podemos ter, só para sustentar o amor, a gentileza, a empatia, freamos o ímpeto destrutivo, mortífero, esse degrau onde tropeçamos.
Primo Levi sobreviveu. Anne Frank foi cedo demais.
Utopia? Talvez. Eu preciso disso, eu acredito. É meu freio, é minha ilusão. Quer segurar essa corda aqui comigo? A gente se ajuda.
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